Uma investigação empírica bastante cuidadosa, publicada recentemente como texto para discussão do Banco Mundial, oferece algumas lições importantes para certas alas dos economistas mais ortodoxos e, também, dos heterodoxos. Ou, se preferir, para certas alas mais à direita e mais à esquerda.
Os autores avaliaram os impactos dos investimentos públicos nos países emergentes com base em uma amostra de 129 países no período 1980-2019. Um primeiro resultado importante é que cada 1% de aumento do investimento público, em % do PIB, gera um efeito sobre o PIB total do país de cerca de +1,1% após quatro a cinco anos. Ou seja: o multiplicador desse tipo de gasto público específico é superior a um.
Tão ou mais importante do que isso é o fato de que esse impacto de +1,1% ocorre tanto sobre o PIB efetivo (mais cíclico, refletindo alterações na demanda agregada) como sobre o PIB potencial (mais estrutural, refletindo a capacidade de oferta de bens e serviços de uma economia).
Isso acontece não somente pela própria expansão do capital público mas também pelo aumento dos investimentos privados, o chamado efeito “crowding-in”: cada 1% de aumento do investimento público eleva as inversões privadas em cerca de 2%.
À luz disso, o estudo identificou que, no médio prazo, aumentos do investimento público geram impacto positivo sobre a produtividade da economia (do trabalho e sistêmica) sem elevar a inflação.
Os achados descritos até aqui são bastante coerentes com o que os economistas mais heterodoxos e as pessoas mais à esquerda costumam defender. Mas o artigo dos autores também dá suporte empírico robusto para alguns argumentos mais ortodoxos, muitas vezes desdenhados ou ignorados pelos heterodoxos.
O estudo indica que o multiplicador dos investimentos públicos pode chegar a +1,6 caso o país tenha um elevado espaço fiscal prévio –leia-se, menor dívida pública em proporção do PIB. Em países muito endividados, o impacto de aumentos do investimento público é bem mais baixo, podendo ser nulo. Isso acontece porque essa expansão dos gastos, caso não seja devidamente financiada (com aumento da carga e/ou redução de outras despesas), pode piorar o quadro de sustentabilidade fiscal, elevando a taxa de juros da economia e impactando negativamente os investimentos privados (efeito “crowding-out”).
O estudo do Banco Mundial também indica que não basta simplesmente gastar mais: a qualidade/eficiência é tão importante quanto aumentar os dispêndios com investimentos. O efeito multiplicador pode chegar a +1,6 com elevada eficiência, caindo para perto de zero com baixa eficiência.
Como o Brasil se posiciona diante desses achados? Temos hoje um espaço fiscal baixo (dívida/PIB alta) e uma eficiência mediana do gasto público com investimento, elementos que reduzem o multiplicador. Por outro lado, temos um estoque de capital público inicial muito baixo (metade daquele observado nos emergentes), que aumenta bastante o multiplicador (outro resultado importante do estudo).
Não está claro qual é o efeito líquido, mas as análises deveriam ser muito mais orientadas por esses aspectos do que por crenças/ideologias.
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Publicitário e Jornalista.