O que impede o Brasil (que já tem um dos melhores portais de transparência do mundo) de ter uma lei que regulamente o lobby?
A resistência dos próprios políticos, que não querem perder o controle sobre as informações e negociações que acontecem nos bastidores. Regular o lobby significa tornar essas influências visíveis, e muitos preferem manter esse poder nas sombras, sem prestar contas à sociedade.
Mas a conquista recente de uma organização sem fins lucrativos, a Fiquem Sabendo, liderada por Maria Vitória Ramos, pode ajudar a mudar as regras do jogo. Ela dá um exemplo inspirador de como a sociedade civil pode avançar nessa agenda e chegar onde os políticos não querem.
A ONG, dedicada a garantir o acesso à informação pública, obteve uma conquista histórica. Em agosto passado o PL 2725/2022 foi aprovado com unanimidade na Câmara dos Deputados, em um feito quase milagroso. O projeto exige que os governos tornem públicos, em meio eletrônico, dados detalhados sobre o sistema educacional, como vagas preenchidas, lista de espera, bolsas de estudo, rendimento escolar e até as atas de reuniões de conselhos de educação. Basicamente, a lei manda colocar a casa em ordem, e à vista de todos.
Daqui à regulamentação do lobby vai um pequeno passo, mas que ao mesmo tempo requer um enorme salto de fé.
Para o sistema político, a legalização e regulamentação do lobby criariam um ambiente de maior transparência, onde as interações entre legisladores e grupos de interesse estariam documentadas e acessíveis ao público, o que reduziria a desconfiança e as acusações de conluio ou corrupção. Mas será que isso interessa?
Políticos e empresas teriam a oportunidade de atuar com mais clareza e segurança, evitando manobras obscuras que alimentam crises de confiança e instabilidade. Mas será que eles querem?
Para a sociedade significaria maior controle e participação no processo legislativo. Mas seria possível? Tornando públicas as influências que moldam leis e políticas, os cidadãos poderiam acompanhar de perto os interesses, o que nivelaria o campo de jogo, impedindo que apenas os mais poderosos tenham acesso privilegiado aos tomadores de decisão. Mas será que esse momento vai chegar?
Com o lobby regulamentado, o jogo político passaria a ser jogado às claras, permitindo que tanto o poder público quanto a sociedade joguem de acordo com regras mais justas e equilibradas.
Essa foi uma das conclusões mais relevantes do encontro “Políticas Públicas de Integração e Cidadania”, organizado pela Associação Portugal Brasil 200 Anos e o Sesc São Paulo e que contou também com a participação da colunista da Folha Eliane Trindade, mentora do Prêmio Empreendedor Social, que distingue este ano o trabalho da Fiquem Sabendo.
Em um momento em que populismos digitais e forças antidemocráticas devoram, de fora para dentro os alicerces da democracia, regular o lobby e ampliar a transparência será talvez o mais importante que os políticos possam fazer para proteger de dentro para fora esses alicerces.
A regulamentação do lobby é essencial para que o Brasil, que até já é referência mundial em transparência digital, se torne também um exemplo de democracia sólida e resistente a pressões internas e externas.
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Publicitário e Jornalista.