O SOS Racismo integra a campanha “Vamos criminalizar o racismo”, lançada em 21 de março de 2024, Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação, que visa propor ao Parlamento português uma alteração da lei de combate ao racismo.
O Grupo de Ação Conjunta Contra o Racismo e Xenofobia, que reúne cerca de 70 coletivos, tem provocado uma discussão sobre a criminalização do racismo, da xenofobia e da injúria racial no pais.
“O objetivo último é a criminalização das práticas racistas que, em Portugal, não existe. A maioria das pessoas pensa que o racismo é um crime em Portugal, mas as práticas racistas não são crime, são apenas uma contraordenação”, explica a jurista Anizabela Amaral, da Kilombo – Plataforma de Intervenção Anti-Racista.
Os casos já previstos no artigo 240 do Código Penal português são considerados ilícitos de mera ordenação social, cuja sanção aplicável é uma ‘coima’, espécie de multa de valor reduzido.
“Nós pretendemos que as práticas racistas que estão previstas como contraordenação sejam criminalizadas e que as sanções possam ir até às penas de prisão”, completa a jurista que integra o Grupo de Ação Conjunta Contra o Racismo e Xenofobia.
Anizabela aponta que há estudos que confirmam o aumento dos casos de racismo e xenofobia em Portugal, que se evidenciam na eleição de políticos da extrema direita com discursos de ódio racial.
“O racismo e a xenofobia não foram inventados pela extrema-direita e não foram criados pelas organizações que lutam contra o racismo. É uma situação histórica, com raízes muito profundas na colonização, na escravatura e, portanto, já existem há muito tempo. Agora estão a tornar visíveis que a população portuguesa, na sua maioria, é racista e xenófoba”, confirma.
A jurista ressalta, contudo, que Portugal tem um problema sério de racismo estrutural e institucional e, portanto, não está afirmando que todo e qualquer português é racista, mas que existe toda uma estrutura que faz com que alguns grupos tenham prioridade a outros em todas as áreas da sociedade.
Multidão vai às ruas exigir Justiça
Além de manifestações em comunidades de maioria negra, como Zambujal e Cova da Moura, onde ocorreu a morte de Odair Moniz, uma grande marcha foi realizada no centro de Lisboa, no último sábado (26), reunindo associações comunitárias e organizações sociais.
No mesmo dia, uma outra manifestação, convocada pelo Chega, partido da extrema direita, em apoio aos policiais e condenando os atos de protesto nas comunidades que, ao longo da semana, resultaram em incêndios de veículos, além de repressão da polícia e prisões.
“O que acontece aqui não é um caso isolado. A história de matar pessoas negras é uma história que não foi interrompida, porque é a mesma estrutura que foi edificada sobre o nosso corpo através da escravatura e que foi alimentada pelo colonialismo e que ainda continua a nos matar”, denuncia o rapper Flávio Almada, um dos coordenadores do movimento Vida Justa.
Licenciado em tradução e escrita, Flávio Almada tem mestrado em estudos internacionais e, assim como Odair, nasceu em Cabo Verde. Ele diz que sentiu na pele agressões da polícia. Ele é morador da Cova da Moura, uma das comunidades negras estigmatizadas pela violência e descaso institucional, cuja ação governamental é restrita à operações policiais.
“A polícia executou o nosso irmão Odair Moniz e não é o primeiro. Temos uma longa lista. Maior parte é de jovens que não chegam até 20 anos, do sexo masculino, que são mortos. Essa é uma parte da morte, que é mais visível, mas há uma morte na penitenciária, que não é vista. Há uma morte, que é pela pobreza, que não é vista. Há um conjunto de mortes que acontecem por falta de habitação e pela miséria que não é vista. Nós estamos aqui para sinalar que nós queremos justiça, não só de um ponto de vista legal, mas de uma mudança estrutural”, pontua Almada.
Publicitário e Jornalista.